Quando o ar lhe pesava, mergulhava a cabeça n’água e via tudo com uma clareza estarrecedora. De repente, tudo fazia sentido, compreendia os pormenores secretos que a atormentavam, olhava de cima para sua própria vida. Como se ela não fosse ela, fosse outra a olhar a vida alheia. Enxergava cada pedaço com frieza médica, juntava os fios soltos, identificava traumas, apontava soluções, percebia os inimigos. Pesava o necessário e o desnecessário, mesmo sabendo que os conceitos de necessidade mudam sempre. Cristalino, cristalino, como nunca pensara nisso antes? O sentido é que não há sentido, somente o objetivo. Viver seguindo o um, sem buscar o outro.
Percebendo-se afogada, chorou. Cada lágrima pode ser a gota d’água. Um dia vai transbordar tudo de uma vez, ela pensa, submergindo a cabeça.
"Olha a voz que me resta
Olha a veia que salta
Olha a gota que falta..."
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