sábado, setembro 20, 2008
“As pessoas enlouquecem calmamente…”
De pedra, do metrô, das avenidas
Gesticulantes, ameaçadores
Loucos de bebida
Loucos de cabeça – ruim ou boa
Eles a querem
Perseguem seus passos
Xingam-na nas plataformas
Apontam o dedo contra ela, que se encolhe
Devem pensar:
“Lá se vai uma louca que pensa ser normal”
Se soubessem que ela sabe
Que no fundo, é como eles
Só ainda não perdeu o último parafuso
Que, aliás, anda frouxo, frouxo
Talvez prestes a cair no ralo
Esvaindo-se na água junto com o fiapo de sanidade que lhe resta
segunda-feira, setembro 08, 2008
Era uma vez no Cine Cafofo
Festa mofada sim, num buraco quente qualquer atrás de um hortifruti, conhecido como Cine Cafofo. A sessão era de “Era uma vez na América”, mas só conseguiu ver a primeira hora do filme. Logo tinha saltado para o bar, estava numa noite especialmente abusada. Facinha, facinha.
Sempre fantasiou que iria fazer sexo por dinheiro, pelo menos uma vez, para experimentar. Mas Melissa não tinha coragem, e nunca cobrava depois das noitadas. Nem que o desempenho do homem tenha sido péssimo e ela merecesse uma recompensa pelos não-orgasmos e pela ausência de carinho. Era a típica puta grátis.
Mas, sentada ali no balcão, Sergio Leone de fundo, Melissa tomou sozinha as primeiras doses de whisky. Entre goles profundos, tentava imitar aquelas atrizes decrépitas do cinema nacional, que bebem álcool com uma desenvoltura de quinta, deliciosamente na lama.
“Tá machucada, gata?”, perguntou um cara. Pergunta errada, meu bem. Sim, ela tinha caído do céu, mas não era idiota, disse Melissa com os olhos, tão claramente que o homem nem insistiu. Meia hora passou e um bonitão sentou ao lado dela. Nem lembra muito bem a cantada que ele adotou. Mas, dane-se, era bonito, e isso que importava.
Quando deu por si, Melissa estava no banheiro com o rapaz, o copo de whisky em uma das mãos, o cigarro na outra e as pernas abertas. Na hora pensou em cobrar, “são 50 pratas”, mas não o fez. Com a cabeça mergulhada em Melissa, o bonitão não parecia assim tão bonito.
O whisky deve ter-lhe subido à cabeça, porque não se lembra de como saiu do banheiro. Estava novamente sentada no bar do Cine Cafofo, Sergio Leone já era uma vez faz tempo e a festa havia definitivamente começado. Percebeu-se conversando com um grupo de pseudões, “ah, o Godard”, “ah, o Kusturica”. Não, queridos, poupem-me, disse Melissa. Ou será que ela só pensou? O whisky não deixou seus neurônios se comunicarem. Ela queria mesmo era pornochanchada.
Quando o mofo havia preenchido totalmente suas narinas, Melissa resolveu que era a hora de terminar a noite. Com alguém, talvez? Saiu do Cafofo, foi para a rua. Acenou para um táxi, 090 era seu prefixo.
De repente Melissa estava ali, sentada no banco da frente do táxi, com o 090 em ponto de bala. Ele tentava entrar em um motel, mas ela despertou do famigerado estado de inebriedade, que teve início horas antes, em uma festa mofada de Laranjeiras. 090 não era o Robert de Niro, nem ela a Jodie Foster em início de carreira.
“Me leva pra casa”, disse ela, que não cobrou as 50 pratas do taxista. Pelo contrário, ainda pagou a corrida, tão ansiosa que estava para desaparecer dali.
sexta-feira, setembro 05, 2008
Cheiros palpáveis
O
É
As
Do
Se
terça-feira, setembro 02, 2008
Apocalípticos e integrados
“As más notícias não param de chegar. Alguém que ficou doente de repente, uma jovem grávida que perdeu o bebê sem motivo aparente, uma tia que descobriu um mal incurável, uma criança que parou de enxergar... Se o corpo humano é realmente uma máquina perfeita, então há algo de muito errado acontecendo. São muitas falhas para o que sempre fora chamado de “o melhor computador do mundo”.
Culpa da vida, não ela em si, natural e sagrada, simples como os quatro elementos. E sim no que o homem a transformou, vida-nêura, vida-estresse, vida-paranóia, vida-fútil.
A máquina não aguenta tanta pressão, é lógico que falha, e cada vez em maior escala, com doenças mais graves e inimagináveis.
O corpo não sustenta a realidade de hoje, e pede socorro, impedindo que crianças venham ao mundo e se transformem em novas vítimas. Alguma coisa está fora da ordem, não só mundial ou universal, mas individual.
Precisamos recomeçar, repensar, apertar o reset e formatar o computador. Senão os vírus vão tomar conta de tudo, transformando-nos na raça dos mutilados pelo nosso próprio corpo, que se autoboicota em resposta ao caos.”